Especialistas explicam sobre a eficácia da Astrazeneca e tiram dúvidas sobre uso; vacina vem acumulando polêmicas, sobretudo em relação aos efeitos colaterais
Com a diminuição do número de doses disponíveis da vacina Coronavac, produzida no Brasil pelo Instituto Butantan em São Paulo, o outro imunizante na guerra contra a covid-19 começa a ficar mais em evidência. A vacina Astrazeneca, desenvolvida na cidade inglesa de Oxford, tem um intervalo maior de aplicação entre as duas doses (três meses), enquanto a Coronavac deve ser aplicada em até 28 dias. No Estado, mais de 87 mil pessoas estão na fila para a segunda dose da Coronavac.
A diferença do intervalo entre as doses da Astrazeneca, de um tempo maior, seria um ponto a favor em tempos de escassez de vacinas. Tanto que a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) irá utilizar exclusivamente a Astrazeneca na imunização de grupos como professores, trabalhadores da Educação e profissionais de Segurança Pública, conforme anunciou o subsecretário em Vigilância em Saúde, Luiz Carlos Reblin, no último dia 26 de abril. A vacina também será aplicada nas pessoas com comorbidades.
Além disso, a Astrazeneca virou a principal aposta nas pretensões de compra pelo Governo do Estado. “Temos três negociações importantes e a principal é a aquisição da Astrazeneca. Quando estiver concreto, o governador fará o anúncio. As outras duas são indústrias que solicitaram sigilo e discrição na aquisição. Algumas negociações podem acabar sofrendo interferências”, reforçou na quinta-feira (06), o secretário de Estado da Saúde (Sesa), Nésio Fernandes.
Efeitos colaterais
A Astrazeneca provocou um certo temor na Europa quando até 4 de março a Agência Europeia do Medicamento (EMA) havia detectado 222 casos de trombose entre 35 milhões de vacinados: um caso a cada 175 mil imunizados, uma incidência muito baixa, segundo especialistas.
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), de janeiro até abril, o Estado recebeu 294.900 doses da vacina. Não há registro de casos de trombose após aplicação. O subsecretário Reblin relata reações leves relacionadas a dores no local da aplicação, febre ou mal estar.
“Isto é perfeitamente esperado em qualquer vacina. Vacinas, historicamente, sempre causam algum tipo de reação. Mas não há registro de efeitos adversos importantes na aplicação de nenhuma das duas vacinas aqui no Espírito Santo”, reforça.
Diante de um cenário de informações conflitantes, a epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Ethel Maciel, e a médica infectologista Carolina Salume explicam detalhes da performance do imunizante e tiram dúvidas sobre seu uso.
De que é feita a vacina AstraZeneca e como ela age?
Segundo a epidemiologista Ethel Maciel, a vacina, chamada AZD1222, foi desenvolvida por uma equipe da Universidade de Oxford e da empresa farmacêutica britânico-sueca AstraZeneca. “Trata-se de uma vacina vetorial. Segundo a Fiocruz, ela foi desenvolvida com a tecnologia de vetor não replicante de adenovírus de chimpanzés, inofensivo para seres humanos. É uma versão mais fraca do vírus de gripe comum em chimpanzés e contém igualmente proteínas contidas no material genético do vírus Sars-Cov-2”, descreve. Após a vacinação, ela explica que o adenovírus penetra em algumas poucas células do corpo humano. Essas células utilizam o gene para produzir a proteína Spike (espícula, ou picos, na superfície do vírus). “O sistema imunológico então reconhece isso como estranho e, em resposta, produz anticorpos e células T, que idealmente protegem contra a infecção com o Sars-CoV-2”, conclui.
Como é feito seu armazenamento e qual é a sua eficácia?
A médica infectologista Carolina Salume explica que a vacina Astrazeneca deve ser conservada sob refrigeração (entre 2ºC a 8ºC). Ela faz uma diferenciação de casos em relação à sua eficácia. “A vacina Oxford/Astrazeneca tem eficácia de 76% contra casos sintomáticos da doença, chegando a 85% em idosos com 65 anos ou mais. Essa vacina ainda confere 100% de eficácia contra casos graves e contra aqueles que exigem hospitalização”, aponta.
E os efeitos colaterais? Em relação a formação de coágulos no sangue e trombose, há estudos conclusivos?
Carolina aponta que há relatos de pacientes que apresentaram os chamados fenômenos trombóticos após uso do imunizante. “Mas não há estudos conclusivos que comprove tal relação”, acrescenta. Ethel concorda e fornece dados numéricos.
“No momento, no Brasil, foram administradas mais de 4 milhões de doses da AstraZeneca. Há 40 casos em investigação. Se olharmos que de quatro milhões de aplicações 40 pessoas apresentaram algum evento, que não foi fatal, é algo muito relevante pelas vidas que foram protegidas. Então, os efeitos são muito raros”, informa. Ela lembra que algumas pessoas já tinham pré-disposição a doenças tromboembólicas.
“Por isso não dá para dizer que é a vacina. A Anvisa fez com que a bula da AstraZeneca constasse essa possibilidade. É muito raro. É um evento muito raro”, reforça. Ambas concordam que os benefícios de se imunizar de uma doença comprovadamente letal são bem maiores que os riscos de um efeito adverso.
Carolina e Ethel são categóricas neste ponto: nada de mesclar imunizantes. “Quem tomou Coronavac deve tomar segunda dose de Coronavac. Quem tomou AstraZeneca deve tomar segunda dose da AstraZeneca. Devemos evitar misturar pois não há evidências científicas ainda”, aponta a epidemiologista, lembrando que o intervalo dela é de 12 semanas (três meses) maior que a da Coronavac, que vai de 14 a 28 dias. “A segunda dose da vacina deve ser feita com a mesma vacina recebida na primeira dose”, conclui a infectologista.
Fonte: R7