Para evitarem rejeição em comissão especial, parlamentares querem deixar a discussão para o ano que vem

A manobra de última hora articulada por partidos de esquerda e do Centrão para trocar ao menos 17 deputados que faziam parte da comissão especial que analisa a PEC (proposta de emenda à Constituição) que regulamenta a prisão após condenação em segunda instância e garantir que a matéria não fosse aprovada no colegiado forçou o relator do projeto, Fábio Trad (PSD-MS), a retirar seu parecer de pauta e querer, agora, adiar para 2022 a votação da proposta.

Antes da mudança na composição da comissão, Trad confiava na aprovação do relatório, pois entende que tinha feito todas as alterações necessárias à proposta original, do deputado Alex Manente (Cidadania-SP), para contemplar os pedidos da maioria dos membros do colegiado. Diante de um cenário diferente, entretanto, ele tentará ganhar mais tempo para mudar o entendimento dos novos integrantes da comissão e impedir que todo o trabalho feito por ele seja perdido.

De acordo com o parlamentar, o adiamento faria com que o tema voltasse a ser discutido entre a sociedade, o que pode interferir no modo como cada deputado votaria na proposta. “Politicamente, o mais prudente é aguardar para o mês de fevereiro [de 2022], pois todos precisam deliberar sobre a matéria com conhecimento de causa. Ao mesmo tempo, temos de ver se a opinião pública se mobiliza melhor. Se houver um maior número de pessoas a engrossar as fileiras em defesa da PEC, isso fortalecerá a matéria”, opina Trad.

A comissão especial ainda terá uma reunião neste ano, antes do recesso legislativo, que começa na sexta-feira (17), mas o deputado quer usar o encontro somente para apresentar a nova versão do relatório. Trad disse que vai promover apenas alguns ajustes periféricos.

Os pontos mais relevantes do texto dele serão mantidos, como o que estabelece que os efeitos da PEC só valerão para as ações ajuizadas após a entrada em vigor da alteração constitucional, e não para ações que já estão em andamento, como constava na proposta original.

Lira cogita acabar com a comissão

undefined

Apesar do desejo do deputado de deixar a proposta para o ano que vem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ainda aguarda uma manifestação da Secretaria-Geral da Mesa da Casa sobre a decisão de Trad de retirar o relatório durante a última sessão da comissão especial.

Lira quer entender se o relator infringiu o regimento interno da Câmara ao não permitir que o texto fosse votado e cogita dissolver a comissão especial por causa da atitude de Trad, o que comprometeria o relatório elaborado pelo parlamentar.

Além disso, no entendimento do presidente da Casa, a comissão está há muito tempo em funcionamento para ainda não ter concluído a análise da PEC — Trad foi designado o relator em dezembro de 2019 e apresentou o primeiro parecer em setembro do ano passado. Por isso, a continuidade do colegiado deveria ser reavaliada.

Trad tem o respaldo do presidente da comissão, Aliel Machado (PSB-PR), que entende que o relator tem poder sobre o parecer e, portanto, o direito de retirar o texto de análise a qualquer momento. Machado espera que Lira não dê fim ao colegiado, pois argumenta que não seria justo acabar com um trabalho de praticamente dois anos dessa maneira.

“Seria muito frustrante, porque esse é um assunto importante para o país. É normal e natural do processo legislativo você aprovar ou reprovar uma matéria, mas não ter nem a análise da proposta eu acho muito ruim. A comissão fez um debate de forma técnica, com subsídios, e o que menos quer é isso [o fim do colegiado]”, opina Machado.

Machado diz que quer votar o relatório quanto antes possível, mas não se opõe à ideia de deixar o texto para 2022. “Nos preocupamos com a aprovação do texto, por isso que esperei um momento menos complicado da pandemia e também o fim da CPI [da Covid-19], para que a PEC pudesse receber a devida atenção. Nós devemos apreciar o texto e expor essa questão [prisão em segunda instância], porque ela não é apenas técnica. A sociedade tem o direito de acompanhar esse tema. O tom da aprovação é a própria população que ajuda a dar, não só o Parlamento.”

Autor da proposta confia em aprovação

Em meio à possibilidade de Lira dar fim à comissão especial mesmo sem a PEC ser analisada, o deputado Alex Manente não perde a confiança. Ele lembra que a dissolução do colegiado não significaria o fim da PEC, pois ela ainda poderia ser levada direto ao plenário da Câmara, apesar de isso não ser algo recorrente.

Assim como Trad e Machado, o autor da proposta acredita que o melhor seria adiar a análise da proposta para 2022. “O ano eleitoral pode ser até importante para temas como esse. O desejo do combate à corrupção precisa reacender na população. Quando a sociedade se mobiliza, conseguimos muitos mais que os votos necessários para aprovar uma matéria, visto que a população fica atenta a como parlamentares votam”, afirma.

De todo modo, caso a PEC seja votada na comissão especial e rejeitada, o que forçaria o colegiado a escolher um novo relator para fazer um parecer contrário ao texto, Manente diz que seria possível reverter essa situação no plenário.

“Eu creio que temos maioria no plenário. Precisamos medir qual é a maneira mais eficiente de chegar até lá, se é por recurso contra a decisão da comissão especial ou um projeto direto do plenário, com o apoio da maioria dos líderes. Tenho certeza de que a opinião da comissão, se for pela rejeição, não vai refletir no plenário.”

Fonte: R7